GUSTAVO MORENO: sincretismo e acaso
Com a arte baiana e o metal no DNA, Gustavo Moreno cria obras que exploram as potencialidades visuais do acaso
Artigo originalmente publicado em & Design Magazine
A HISTÓRIA PESSOAL de Gustavo Moreno ressoa com a da própria cidade de Salvador, um ponto de confluência para diversas rotas transatlânticas, onde culturas distintas se cruzaram e se recombinaram. Ele é filho de Mimi Fonseca, pintora católica de ascendência portuguesa, e Tatti Moreno, escultor baiano ligado ao candomblé, criador dos icônicos monumentos de metal que representam os Orixás no Dique do Itororó.
Como um andarilho pelas ruas da cidade, esse artista desenvolveu esculturas compostas de objetos encontrados pelo caminho: pedaços de móveis, porcelanas, itens religiosos e objetos do cotidiano.
Em Água Santa, por exemplo, um pedaço de móvel com curvas que evocam ondas do mar é disposto junto a uma peça de madeira e sustenta um copo de vidro. Se os objetos foram recolhidos ao acaso da caminhada, sua união potencializa os sentidos neles latentes: o copo, que contém água e sacia a sede, remete ao mesmo elemento que a ondulação do entalhe.
A madeira espiralada lembra também os altares barrocos de Salvador, onde se guarda a água benta. Essas esculturas extrapolam, no entanto, o catolicismo e o conjunto delas foi batizado como Sincréticas, relembrando que a água é um elemento fundamental também nos rituais do candomblé, onde está ligado às orixás femininas, as Yabás.
O formato vertical predominante, aliado a elementos simbólicos, faz referência aos totens, objetos etnográficos usados por algumas culturas para simbolizar a pertença a um povo ou genealogia. O caráter rústico e corroído dessas esculturas ressalta ainda a ação do tempo sobre esses objetos, mostrando como cada elemento se submete às forças que atravessam gerações, conectam pessoas, constroem cidades e culturas, e governam o destino dos objetos.







